Diane Arbus


O retrato fotográfico, como um gênero aliado às tradições da representação das fisionomias, atua no campo do sensível, da fotogenia. Diz respeito à presença expressiva relacionada não com uma referência meramente informativa dessa expressividade (apesar de no caso fotográfico essa referência ser eminentemente figurativa), mas com uma atitude que emana do olhar daquele que fotografa e que se reflete na expressão do sujeito fotografado. Um retrato pode não ser apenas a imagem de um rosto anódino, mas a percepção de uma natureza emocional que se impregna de sentimentos conotados. Apresenta um autor que, em alguns casos, identifica seus retratados como um caçador de si mesmo, numa procura incessante por um conhecimento de si que se reflete no outro.

 Muitas vezes, pela contestação, ou pelo desconforto de estar convivendo com as normas estabelecidas pelo senso comum, as imagens expressivas podem evocar estranhas fissuras. Como em Diane Arbus (1923 - 1971) que, ao fotografar "esquisitices", determinou imagens que podem ser surpreendidas pela exaltação de um sentimento que se revela como uma síntese da sua época e de seu lugar.
Seus retratos podem também sustentar uma mensagem em aspectos que são de uma natureza emotiva mais evidente. Outras vezes um traço crítico se revela internamente, como um sentimento na altura da carne desprotegido de gordura e de pele: uma dimensão dolorosa.
Na fotografia de Diane Arbus há uma forma de proceder na qual uma atmosfera psicológica se revela, a partir da expressividade que se vê refletida em seu referente.

"Tenho certeza de que há limites. Só Deus sabe, quando as tropas começam a avançar em nossa direção, como somos atacados pela sensação de que podemos ser mortos a qualquer momento."
(D. Arbus)
Nascida nos Estados Unidos, Diane trabalhou como fotógrafa de moda, mas se fez notar por sua fotografia de pessoas estranhas. Sujeitos sempre à margem da normalidade, absolutamente distantes do mundo idealizado pelos elementos da moda. Personagens carregados de traumas vividos por sua própria condição social. Arbus é uma prova concreta de que a técnica fotográfica não funciona apenas como o rastro luminoso de um referente, mas, como algo muito sutil no território das emoções. Um índice da atitude de quem utiliza a fotografia para obter mais que uma imagem memorial.
"Eu sempre fui da opinião que as fotografias - eu falo de minhas próprias fotografias - não podem ter um significado para ninguém que não eu. Eu gostaria de as guardar para mim, porque tenho o sentimento de que elas estabelecem uma certa relação entre a minha pessoa e os assuntos."
(D. Arbus) 


Nas fotografias de Diane Arbus existe uma relação direta com estados anímicos e com fisionomias, que se expressam numa relação instantânea com o olhar do fotógrafo, um sistema psicológico atuando como um campo de atrações e de repulsões. A frontalidade dos enquadramentos revela a sua atitude direta, curiosa, que é cúmplice e ao mesmo tempo crítica. Não há isenção. O ato fotográfico cumpre aqui um rigoroso caminho, num universo de particularidades onde exprime o seu repúdio pelo convencional, pelo conforto de uma vida cosmética numa sociedade hipócrita. Não há um tipo humano único, nem uma verdade única.
A narrativa presente na obra de Arbus é de reação aos ideais de uma sociedade de consumo em que a imagem pertence a uma ordem positiva e a liberdade, como um valor presente que garante a todos uma condição democrática de vida, é ilusória. Há na sociedade de consumo uma sensação de repúdio ao mundo dos anormais, esse mundo bizarro que denuncia a hipocrisia do mundo "normal"; é nessa via que Arbus trafega.
Suas fotos realizam um mergulho no universo de "estranhas" personagens, num mundo que se opõe ao "conceito helenístico" de beleza em favor de uma espécie de desvio na "maravilhosa construção do universo". Se há uma idéia de cumplicidade nas fotos de Diane há também, paradoxalmente, uma espécie de distanciamento, de impossibilidade de efetiva comunicação.
Nesse processo, há primeiro uma idéia de catarse, de compartilhar com o outro, para sublimar a própria dor, depois uma verificação da distância que separa um de outro (a impossibilidade) e, finalmente, a forma do estranhamento natural da imagem que transmite para os outros a performance do ato fotográfico. Uma chave importante do pensamento de Arbus tem a ver com uma idéia de paixão e de loucura. O sujeito apaixonado (Diane) procura incessantemente aplacar a dor de sua paixão:
"Achamos que todo enamorado é louco. Mas podemos imaginar um louco enamorado? De modo algum. Eu só tenho direito a uma loucura pobre, incompleta, metafórica: o amor me deixa como louco, mas não comunico com a sobrenatureza, não há em mim nada de sagrado: minha loucura, simples perda de razão, é insignificante e até invisível; de resto totalmente recuperada pela cultura: ela não mete medo." (Roland Barthes)
A fotografia do jovem americano com a bandeira, feita na emergência da ferida chamada Vietnã, revela num personagem a inconsciência louca de uma sociedade, que pelo valor de um ideal perversamente libertário, imprimiu aos outros o imperialismo bélico que lhe é tão característico. Num período que conheceu uma contracultura, que ampliou tantos limites, a obra de Diane se revela como a dor das consciências minoritárias, que num dado momento passam a intervir contra o sentido dominador do conservadorismo agressivo.
A insanidade expressiva do "jovem patriota" é um fato da imagem, a energia física de Arbus agiu sobre ele de maneira a ultrapassar os limites do "espaço-temporal" imediato. Essa imagem é também uma metáfora, com ela se pode reconhecer um problema que é próprio não só do nacionalismo americano, mas também da alienante loucura do fanatismo.
Outro aspecto presente em Diane Arbus é a noção de espelhamento do autor no personagem retratado, sua capacidade de transformar em loucura e estranhamento tudo o que fotografa. Como na história do rei Midas, que tudo o que tocava virava ouro, tudo o que Arbus fotografou se fazia transtornado, bizarro ou infeliz.

oS CONTURBADOS ANOS 1960

Herdeira de August Sander − fotógrafo alemão conhecido por seu trabalho documental e pelos retratos dos mais diferentes tipos humanos −, contemporânea e profunda admiradora de Richard Avedon, Diane Arbus tinha em comum com estes dois fotógrafos o interesse pelo indivíduo e a escolha pelo formato de retrato. Opções que serviram, muitas vezes, como metáforas em que a artista questionava a sociedade americana do século 20. A escolha por retratar pessoas incomuns ou em poses idiotas era intencional no seu projeto de revelar outra América, menos potente e mais decadente. Por outro lado, ao sugerir um mundo em que todos são estranhos ou apresentam algo de bizarro e perturbador, a artista parecia desvelar algo íntimo.
“Diane Arbus foi a artista mais corajosa do seu tempo”, afirma o pesquisador e crítico de fotografia Rubens Fernandes Jr. “Corajosa porque teve iniciativa para abandonar seu conforto familiar e de trabalho para enveredar numa aventura ruidosa e praticamente sem volta. Foi uma das primeiras (como mulher e fotógrafa) a trazer um tema assimétrico para seu formato simétrico (fotografava em 6 X 6 cm). Ela trouxe para seu quadro temas impertinentes para uma sociedade acomodada e dominadora. Ela buscou entender o ‘outro’, socialmente diferenciado, trazendo-o como imagem desta mesma sociedade cuja autoimagem era completamente diferente daquela que ela evidencia. Essa coragem de se envolver com as pessoas e com tudo o que isso significava politicamente (e economicamente) a deixava quase sem forças para encarar novamente o conforto do seu espaço íntimo”, completa.


POUCO FAMILIAR NO BRASIL
Apesar de suas imagens causarem grande impacto no espectador, elas não ficaram muito conhecidas no Brasil, pelo menos para o grande público. O conhecimento veio através do filme A pele (2006). Na película, as peripécias da fotógrafa atrás de diferentes tipos de pessoas – como quando frequentava o Club 82, casa novaiorquina que promovia shows com transformistas – foram potencializados pela atriz Nicole Kidmam, que representou uma Arbus estereotipada.
Para o fotógrafo e idealizador do Festival Agosto da Fotografia, Marcelo Reis, “poucos são os fotógrafos brasileiros influenciados pelo trabalho de Diane. A própria forma como o trabalho da fotógrafa foi pouco divulgado no Brasil resultou em que muitos nunca tenham visto uma sequer de suas imagens”.
“Se considerarmos que os trabalhos mais marcantes de Arbus são aqueles nos quais ela nos mostra ‘pessoas estranhas’, é inevitável questionar o que estas imagens têm de especial. Plasticamente, as fotografias não seguem as regras da ‘boa composição’ das belas artes ou o ‘momento decisivo’ consagrado por Cartier-Bresson. Longe disso, são registros diretos, simples, até amadores. Talvez por isso Arbus não seja tão popular entre nós, ainda tão contaminados pela tradição pictórica dos velhos salões de arte”, reflete José Mamede.
Depois do suicídio, há exatos 40 anos, toda a sua obra ficou sob a tutela da filha mais velha, Doon Arbus. Desde o lançamento do livro Diane Arbus – An Aperture Monograph (1972), apenas mais três livros foram liberados: Magazine Work (1984, esgotado), Untitled (1995) eRevelations (2003), além da biografia não autorizada Diane Arbus - A Biography, de Patrícia Bosworth. Este último resultou numa importante exposição, Diane Arbus Revelations, realizada pelo Museum of Modern Art de San Francisco.
Além das fotografias, as filhas de Diane doaram também um conjunto de documentos que inclui papéis pessoais, cartas, livros e um diário. As raras exposições pelo mundo representam, ainda que involuntariamente, o gosto de Arbus, que era avessa a expor seu trabalho. Talvez por saber que, durante anos, a crítica preocupou-se mais com as personalidades por ela retratadas do que com a complexidade da sua obra. ©








                                 Adrebal Lírio                                

                                        

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   Imagem / Adrebal Lírio

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Fotografia / Adrebal Lírio

                   LIBERDADE É UM FARDO
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        DIGNIDADE
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Fotografia / Adrebal Lírio

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     INTÍMA
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Fotografia Adrebal Lírio

Olhe nos meus olhos Como corações, mentes
Reações, gestos orações, mentes.
Mentes
  Foto /Adrebal Lírio

Medo 
O homem está sempre com fome!
Esqueça a hemorragia
Mas esconda o sangue
Sorria e finja o resto
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FINJA 

Foto/Adrebal Lírio

O novo TEMPO está chegando!
deixe a janela aberta! 
A ilusão vai entrar!
Mentira, mentira,mentira
Mentira,mentira
Mentira
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Fotografia Adrebal Lírio

T
R
A
TRAGADA
A
D
A

Tragada após tragada
Tragada após tragada
Como dói 
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